21 de abril de 2009

Está na lei...

Leiam a notícia. Coimas de 100 Euros, no mínimo, para gente que vive com dificuldade à custa da reforma, e que não sabia da alteração da lei. Ainda por cima, a esmagadora maioria enquadra-se num escalão de rendimento que vai resultar em zero a pagar em sede de IRS. Mas vão ter de pagar a coima de CEM EUROS pelo atraso na entrega da declaração.

O Ministério das Finanças vai mais longe e vai buscar à gaveta o célebre brocardo segundo o qual o desconhecimento da lei não aproveita a ninguém.

Pois, é verdade, está na lei. E o Ministério das Finanças socorre-se da lei.

O problema é que o que está na lei só deve valer enquanto for bom. Desconhecer a lei não é desculpa, mas é pressuposto inalienável deste brocardo que a lei possa ser conhecida em termos razoáveis pelos seus destinatários. Isto não está lá no mesmo artigo, mas é óbvio num estado de direito democrático.

Ainda para mais num tempo de verborreia legislativa, em que, a título de exemplo, o regulamento das custas judiciais, que entrou ontem em vigor no meio de polémica, teve SEIS versões antes de entrar em vigor. Já estava publicado em Diário da República, mas teve SEIS versões antes de entrar em vigor. A última alteração aconteceu na passada sexta-feira...

Hoje em dia já não se usa o prazo entre a publicação e a entrada em vigor para dar tempo aos destinatários e aplicadores da lei para se inteirarem dos seus variados aspectos. Hoje esse tempo serve para corrigir a lei mal feita.

O Código de Processo Civil, um dos pilares da democracia em termos de códigos, que é de Dezembro de 1995, já vai na 37.ª versão, sendo que só no ano passado foi alterado seis vezes: em Fevereiro, Abril, Julho, Agosto, Outubro e Novembro. Isto revela uma coisa: falta de planificação, falta de competência, falta de seriedade na elaboração das leis.

Como é que um normal cidadão consegue manter-se a par disto, quanto mais um idoso reformado, que nem computador tem?

Um outro exemplo de lei mal feita, que felizmente ainda está no parlamento, é a trapalhada do sigilo bancário, projecto do Bloco de Esquerda, aprovado na generalidade com os votos do PS, elaborado de forma trapalhona, com pressa da ribalta. A notícia de ontem aqui e as reacções aqui.


Voltando ao caso das declarações do IRS, o Fisco vai agora com toda a certeza ser muito diligente a enviar cartas para casa dos reformados com a coima para pagar, ou com sorte até lhes envia alguém a casa. E depois ? Ficam sem algum do dinheiro da pensão para os medicamentos, para a roupa, para a comida ?

Sr. Ministro das Finanças: o Fisco devia ter enviado uma carta há muitos meses atrás, explicando aos destinatários das leis que a legislação tinha sido alterada e que teriam de passar a entregar a declaração de rendimentos. Isto sim, colocava as coisas moralmente no seu devido sítio.

Assim não há moral para aplicar o brocardo. Sim, pois, mas está na lei. Nisso o Ministério tem toda a razão.

2 comentários:

Lady Godiva disse...

Ai, a crise, Aníbal, a crise... Tu a dares-lhe com a crise...
Será que alguma vez não estivemos em crise? Gostava de saber a tua opinião.
E, já agora, será por isto tudo que queres a tua vida rapidamente mudada, como por estas bandas revelaste, aqui há atrasado? Desconfio que sim. E, a propósito, a vidinha já mudou ou vai nesta "mesmice"?!

Beijos sem crise!

P.S. Mas olha que tens toda a razão, homem!

Aníbal Meireles disse...

Lady: é uma excelente questão. Acho que quase todos acham que não, mas sempre disseram que sim no dia-a-dia. Ou será que é melhor escrever "dia adia" ?

Eu quero mudar porque não me sinto bem como estou. E não vejo maneira de me sentir bem sem mudar. A vida está a mudar, lentamente, mas sim, a mudar, sim senhora! A falar noutras paragens de comboio!

Beijos