4 de maio de 2010

Cruzei-me com um blog, comentei, e decidi colocar aqui também:

Hoje cruzei-me com dois blogs interessantes e que aproveito para recomendar: o bitaites.org, e o citadino.blogspot.com

Não sei porquê, mas chamou-me em particular a atenção um post no citadino intitulado "A evolução tecnológica está a roubar os nossos empregos?".

E, como não concordava em absoluto com o teor do texto a partir de certa altura, e, igualmente com a conclusão que o autor do post retirava do texto que acabara de traduzir, comecei a escrevinhar um comentário que está lá publicado, e que, às tantas, me pareceu digno de constar também aqui, como post autónomo.


Aqui vai:

Aproveito, nesta primeira visita proveitosa, para lhe dar os parabéns pelo blog, mas também para discordar aqui neste post que me chamou a atenção:

Tudo o que disse inicialmente sobre a impossibilidade de permanecer uma situação de desemprego a longo prazo com a introdução de novas tecnologias e maquinarias parece-me certo e advém da experiência que a humanidade foi coleccionando, mas depois chega ao "agora" e parece perder a objectividade e a perspectiva histórica e desaba no dito pessimismo ludita que tão bem trouxe à discussão.

Há inúmeros exemplos que podia citar para demonstrar que a tese de que o automatismo vai retirar os empregos a ponto de implicar uma reformulação do paradigma económico está errada, mas cito apenas dois.

(Atenção, não digo que não seja desejável fazer uns ajustes - de monta - de equidade no paradigma, mas não é certamente por culpa da tecnologia que os ajustes são necessários.)

Primeiro, a tecnologia, como reflexo do progresso da sabedoria humana que é, permite-nos unicamente continuar a seguir em frente. Tenho a ideia que até foi o ministro da agricultura que mencionou isto noutro dia, e, embora patusco, o exemplo é verdadeiro: das carroças puxadas por bois ou burros passámos para os veículos a motor e deixou de exisitr a necessidade de ter uma indústria de carroças e criações tão grandes de burros e bois, e alimentação para os ditos, e toda a logística que isso implica, mas passou a haver a necessidade de mecânicos e oficinas e toda uma indústria à volta - óleo para o motor, filtros, pastilhas de travões, petróleo(!), escolas de condução, instrutores, fábricas que produzem semáforos e sinalética de trânsito, entre muitas outras, e, além disso, não foi por isso que deixou de haver uma pessoa a comandar os destinos da carroça, ou do automóvel.

Ou seja, além das indústrias ligadas ao desenvolvimento da tecnologia, haverá sempre emprego para o motorista. E digo isto tanto no sentido literal como metafórico. Se pudesse resumir diria: quem é que repara a máquina que repara a máquina se não houver máquina para reparar a máquina ? Há sempre o criador da máquina.

Pergunte-se porque é que ainda hoje, com todos os computadores, as linhas de metro e comboio são vigiadas por humanos e as carruagens são "conduzidas" por humanos. Em bom rigor podia ir sem tripulação - aquilo vai sobre carris, o que é que aquilo tem de difícil para um computador ? Nada. Mas se as coisas correm mal ao computador, tem de lá estar alguém para tomar uma decisão, reagir, activar o meio mecânico, à moda antiga, para nos salvar a nós todos. Ou pura e simplesmente para tomar uma decisão que "sai do sistema", e que se inclui na esfera da política.

Os clubes de vídeo, tema recente da actualidade, por exemplo, estão condenados a deixar de existir. Mas agora há empregos na indústria da fibra óptica, dos computadores, na indústria dos conteúdos digitais, online, etc. Outro caso: há 50 anos não havia jogos de computador. Hoje já quase não se fabricam piões de madeira, mas há uma indústria fulgurante de jogos, programadores, criadores de arte digital, fabricantes de placas gráficas, etc

Segundo, a própria indústria da tecnologia cria empregos: quem é que desenvolve continuamente as máquinas que nos facilitam a vida (e ao mesmo tempo revelam novas possibilidades de progredir, ou seja, novas complicações, fazendo o ciclo de inovações continuar e com isso novas necessidades de mão-de-obra especializada), seja na agricultura, nas pescas, na aviação, na confeccção têxtil, na alimentação, nas comunicações, no entertenimento, etc? Quem é que as comercializa, distribui, repara, dá assistência técnica e comercial ?

As máquinas ? As máquinas não têm o imaginário humano. Poderia conjecturar aqui um cenário em que sim, mas eu sou péssimo a fazer futurologia; contudo uma certeza tenho: no dia em que isso acontecer, nós cá estaremos para ter uma ideia melhor (ou seja, não acredito nada que as máquinas venham a ter o nosso imaginário). Afinal somos nós que criamos as máquinas e as aperfeiçoamos.

Mas acima de tudo, acreditar que a tecnologia nos vai roubar os empregos é acreditar que quando esse dia chegar, o ser humano e tudo o que nos rodeia chegou ao limite da transformação, da evolução, da criatividade. E isso é negar toda a história que temos para trás e toda a lógica que subjaz à existência "tout court". É a criação ultrapassar o criador, em todos os sentidos. E isso é uma subversão da lógica impossível, no meu entender.

Felizmente, (penso que) está enganado.

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