Aviso prévio: não faço a mínima do que tem acontecido por estas bandas dos blogues. Vou portanto inteirar-me nos próximos dias do que se tem passado.
Mas amanhã é dia de greve. Portanto tomem lá e até depois de amanhã.
23 de novembro de 2010
14 de outubro de 2010
Curioso
O Governo do Chile foi eleito no início do ano e logo poucos meses depois depara-se com um acontecimento que podia ter sido uma tragédia, mas não foi. Foi um acontecimento notável, de grande solidariedade e determinação para que tudo corresse bem.
Um planeamento sério, rigoroso, inteligente, cuidado, que não poupou esforços e atenção ao pormenor, para que tudo corresse pelo melhor.
E correu, felizmente. Se não tivesse corrido, eu gostava de saber o que seria dito pela população, apesar de todos os esforços de todos, incluindo a notável resistência física e psicológica dos mineiros. Falta se sorte ? Deus afinal não quis ?
Regressar excusivamente à culpa de quem deixou a incúria imperar na mina ? - Claro, mas isso é algo que porém terá de ser feito sempre, porque tem de se julgar e condenar quem tiver culpa pelo sucedido.
É que no meio de psicólogos que estudaram a situação e deram aconselhamento; médicos que fizeram as avaliações necessárias - até ao pormenor de decidir a estratégia correcta do ponto de vista médico e psicológico para a ordem de saída dos mineiros da mina; dos profissionais da Nasa que foram ajudar com os seus conhecimentos; da Marinha que que construiu, fruto do seu saber e estudo das condições concretas, uma cápsula para resgatar os mineiros; da broca que veio de tecnologia para furar poços de petróleo; dos planos A, B e C, que estavam estudados para que tudo corresse pelo melhor, mesmo que acontecesse alguma coisa má, - dizia eu, no meio de todos os meios humanos dedicados à causa, colocando em prática o seu saber e experiência profissionais e técnicas, no meio dessas pessoas que trabalhavam para um resultado, havia aquelas que rezavam.
Sendo um país religioso, em que até o Presidente se socorre de Deus quando interessa, em que os mineiros e respectivas famílias também suponho terem na sua maioria alguma forma de religiosidade, parece que tal romaria e rezas na superfície da mina possam ter, especialmente em contacto com os mineiros - através do telefone ou videoconferência - um papel de esperança e apaziguador - uma almofada psicológica. Desse ponto de vista eu compreendo a utilidade - são pessoas que acreditam mutuamente na mesma coisa, portanto é capaz de funcionar. Mas não serve para os tirar de lá sãos e salvos. Nem chega para falar com eles. Os telefones, equipamento e cabos que levam o sinal de áudio e vídeo para a videoconferência foram inventados e produzidos por pessoas, sem as quais e o respectivo esforço e dedicação nada daquilo teria sido possível - nem sequer os encontrar passados 17 dias.
Curioso que no meio da religiosidade que seguiu em paralelo o trabalho de salvamento dos mineiros, o apelidado 34.º mineiro, o Ministro das Minas, uma pessoa com qualificações de facto para o exercício da pasta (ao contrário do que muitas vezes acontece por aqui) - é engenheiro civil industrial - que coordenou todo o projecto, é agnóstico e nunca teve militância política.
Notícia no jornal Público:
http://www.publico.pt/Mundo/laurence-golborne-ministro-das-minas-o-34º-heroi_1460877
Um planeamento sério, rigoroso, inteligente, cuidado, que não poupou esforços e atenção ao pormenor, para que tudo corresse pelo melhor.
E correu, felizmente. Se não tivesse corrido, eu gostava de saber o que seria dito pela população, apesar de todos os esforços de todos, incluindo a notável resistência física e psicológica dos mineiros. Falta se sorte ? Deus afinal não quis ?
Regressar excusivamente à culpa de quem deixou a incúria imperar na mina ? - Claro, mas isso é algo que porém terá de ser feito sempre, porque tem de se julgar e condenar quem tiver culpa pelo sucedido.
É que no meio de psicólogos que estudaram a situação e deram aconselhamento; médicos que fizeram as avaliações necessárias - até ao pormenor de decidir a estratégia correcta do ponto de vista médico e psicológico para a ordem de saída dos mineiros da mina; dos profissionais da Nasa que foram ajudar com os seus conhecimentos; da Marinha que que construiu, fruto do seu saber e estudo das condições concretas, uma cápsula para resgatar os mineiros; da broca que veio de tecnologia para furar poços de petróleo; dos planos A, B e C, que estavam estudados para que tudo corresse pelo melhor, mesmo que acontecesse alguma coisa má, - dizia eu, no meio de todos os meios humanos dedicados à causa, colocando em prática o seu saber e experiência profissionais e técnicas, no meio dessas pessoas que trabalhavam para um resultado, havia aquelas que rezavam.
Sendo um país religioso, em que até o Presidente se socorre de Deus quando interessa, em que os mineiros e respectivas famílias também suponho terem na sua maioria alguma forma de religiosidade, parece que tal romaria e rezas na superfície da mina possam ter, especialmente em contacto com os mineiros - através do telefone ou videoconferência - um papel de esperança e apaziguador - uma almofada psicológica. Desse ponto de vista eu compreendo a utilidade - são pessoas que acreditam mutuamente na mesma coisa, portanto é capaz de funcionar. Mas não serve para os tirar de lá sãos e salvos. Nem chega para falar com eles. Os telefones, equipamento e cabos que levam o sinal de áudio e vídeo para a videoconferência foram inventados e produzidos por pessoas, sem as quais e o respectivo esforço e dedicação nada daquilo teria sido possível - nem sequer os encontrar passados 17 dias.
Curioso que no meio da religiosidade que seguiu em paralelo o trabalho de salvamento dos mineiros, o apelidado 34.º mineiro, o Ministro das Minas, uma pessoa com qualificações de facto para o exercício da pasta (ao contrário do que muitas vezes acontece por aqui) - é engenheiro civil industrial - que coordenou todo o projecto, é agnóstico e nunca teve militância política.
Notícia no jornal Público:
http://www.publico.pt/Mundo/laurence-golborne-ministro-das-minas-o-34º-heroi_1460877
4 de setembro de 2010
Um mundo assustador que acredita no Pai Natal
O mundo tem destas coisas.. de vez em quando somos confrontados com a sua faceta mais assustadora.
Tenho para mim nas décadas que já vivi que todos mentem. Uns mais, outros menos, uns para se protegerem dos outros, outros para prejudicar os outros. Mentiras pequenas e relativamente inócuas ou mentiras mais graves.
E o que acaba por acontecer quando se conta uma mentira é muito simples: a verdade do que aconteceu ou do que é pode nunca ou só muito tarde vir ao de cima.
Temos de estar atentos a todos, miúdos e graúdos. Mas é certo que nem todos são iguais, e no meio de tudo há que dizer que os graúdos têm a responsabilidade moral de formar a geração que lhe sucede de forma a que eles possam pensar pela sua própria cabeça e serem pessoas mentalmente saudáveis.
Mais do que deixar como legado uma herança, que acaba muitas vezes por despertar os piores instintos nas pessoas, o melhor que se pode dar aos filhos é educação. E que eles com a educação recebida construam o seu próprio património e que sejam felizes.
Quando constato que são os próprios pais que embarcam numa sociedade materialista e irracional, e que mentem deliberadamente aos filhos, que acreditam!, numa figura bonacheirona que nunca, em circunstância alguma, cabe pela chaminé de casa nenhuma (além de ser um disparate perigoso), então estamos conversados acerca da inteligência humana.
O problema da fantasia aqui é que apenas o é para metade dos envolvidos. Os pais sabem que o Pai Natal não existe, mas conjuram um plano para que os filhos acreditem na personagem durante os primeiros anos. E conseguem fazê-lo em muitos casos.
Qual é o problema de os pais dizerem ao filhos que aquelas prendas são compradas com o dinheiro que os pais ganharam a trabalhar ? Os filhos vão gostar menos das prendas, vão divertir-se menos por causa disso ? Não é até muito melhor que os filhos comecem logo a estabelecer a correspondência entre o que recebem e a origem das prendas, para melhor perceberem que aquilo custa a ganhar e não cai do céu/da chaminé em segredo pela calada da noite ?
Tenham juízo! Passados uns anos os filhos crescem e começam a perceber que afinal é tudo mentira - e assim se começa no caminho da mentira - porque até se pode mentir se for por uma coisa bonita como o Pai Natal, não é ? Em vez de explicar como as coisas funcionam e que a verdade também pode ser uma coisa muito bonita.
É a mesma coisa que dizer que podemos deixar entrar as pulgas em casa se elas vierem perfumadas. O facto de elas morderem na mesma passa para segundo plano.
Vão-me dizer que isto não é assim tão grave. É um exemplo, meus caros. De muitos. E de como as crianças acreditam em muitos disparates que se lhe contam, porque têm parca experiência e são dependentes. E os adultos também acreditam noutros disparates, mais elaborados, normalmente daqueles que ficam uns pontos acima do QI médio da população semi-analfabeta deste país que se limita a insultar no café real ou virtual sem saber nada do que se passa e - pior, sem tentar minimamente, proactivamente, saber.
Quando eu vou ao cinema eu sei que aquilo é ficção. Toda a gente sabe que ali estão actores, e uma vasta equipa que realizou e produziu o filme. E quando vertemos uma lágrima numa cena mais emotiva ou ficamos agitados num momento de grande acção, nesse momento nós estamos como que dentro do acontecimento - e nesse momento nós quase que acreditamos que aquilo existe mesmo. Esse é o bom cinema, que nos transporta de forma credível lá para dentro.
Mas depois saímos da sala e ninguém quis enganar ninguém. Aquilo é ficção, entretenimento do bom, que nos fez pensar, nos pôs alegres ou emocionados e até nos pode fazer sonhar e inspirar para fazer algo de grande. Essa é a mensagem, e o filme vale por isso. De que vale o Pai Natal ?
Tenho para mim nas décadas que já vivi que todos mentem. Uns mais, outros menos, uns para se protegerem dos outros, outros para prejudicar os outros. Mentiras pequenas e relativamente inócuas ou mentiras mais graves.
E o que acaba por acontecer quando se conta uma mentira é muito simples: a verdade do que aconteceu ou do que é pode nunca ou só muito tarde vir ao de cima.
Temos de estar atentos a todos, miúdos e graúdos. Mas é certo que nem todos são iguais, e no meio de tudo há que dizer que os graúdos têm a responsabilidade moral de formar a geração que lhe sucede de forma a que eles possam pensar pela sua própria cabeça e serem pessoas mentalmente saudáveis.
Mais do que deixar como legado uma herança, que acaba muitas vezes por despertar os piores instintos nas pessoas, o melhor que se pode dar aos filhos é educação. E que eles com a educação recebida construam o seu próprio património e que sejam felizes.
Quando constato que são os próprios pais que embarcam numa sociedade materialista e irracional, e que mentem deliberadamente aos filhos, que acreditam!, numa figura bonacheirona que nunca, em circunstância alguma, cabe pela chaminé de casa nenhuma (além de ser um disparate perigoso), então estamos conversados acerca da inteligência humana.
O problema da fantasia aqui é que apenas o é para metade dos envolvidos. Os pais sabem que o Pai Natal não existe, mas conjuram um plano para que os filhos acreditem na personagem durante os primeiros anos. E conseguem fazê-lo em muitos casos.
Qual é o problema de os pais dizerem ao filhos que aquelas prendas são compradas com o dinheiro que os pais ganharam a trabalhar ? Os filhos vão gostar menos das prendas, vão divertir-se menos por causa disso ? Não é até muito melhor que os filhos comecem logo a estabelecer a correspondência entre o que recebem e a origem das prendas, para melhor perceberem que aquilo custa a ganhar e não cai do céu/da chaminé em segredo pela calada da noite ?
Tenham juízo! Passados uns anos os filhos crescem e começam a perceber que afinal é tudo mentira - e assim se começa no caminho da mentira - porque até se pode mentir se for por uma coisa bonita como o Pai Natal, não é ? Em vez de explicar como as coisas funcionam e que a verdade também pode ser uma coisa muito bonita.
É a mesma coisa que dizer que podemos deixar entrar as pulgas em casa se elas vierem perfumadas. O facto de elas morderem na mesma passa para segundo plano.
Vão-me dizer que isto não é assim tão grave. É um exemplo, meus caros. De muitos. E de como as crianças acreditam em muitos disparates que se lhe contam, porque têm parca experiência e são dependentes. E os adultos também acreditam noutros disparates, mais elaborados, normalmente daqueles que ficam uns pontos acima do QI médio da população semi-analfabeta deste país que se limita a insultar no café real ou virtual sem saber nada do que se passa e - pior, sem tentar minimamente, proactivamente, saber.
Quando eu vou ao cinema eu sei que aquilo é ficção. Toda a gente sabe que ali estão actores, e uma vasta equipa que realizou e produziu o filme. E quando vertemos uma lágrima numa cena mais emotiva ou ficamos agitados num momento de grande acção, nesse momento nós estamos como que dentro do acontecimento - e nesse momento nós quase que acreditamos que aquilo existe mesmo. Esse é o bom cinema, que nos transporta de forma credível lá para dentro.
Mas depois saímos da sala e ninguém quis enganar ninguém. Aquilo é ficção, entretenimento do bom, que nos fez pensar, nos pôs alegres ou emocionados e até nos pode fazer sonhar e inspirar para fazer algo de grande. Essa é a mensagem, e o filme vale por isso. De que vale o Pai Natal ?
21 de junho de 2010
Duas respostas para questões sem resposta
Rute e Guida , respondo-vos em forma de post aos vossos comentários ao último texto.
Rute, quando dizes "Não sei se concordo contigo quando disses que as pessoas precisam de acreditar em Deus, como se essa necessidade fosse universal! Penso que não, há pessoas que não acreditam, não querem, nem precisam de acreditar.",
atenta que eu disse, e cito: "Talvez um dia também consigamos demonstrar cientificamente a teoria social do porquê muitas pessoas sentirem a necessidade de acreditar em Deus (...)" e no parágrafo seguinte: "(...) mesmo para alguns desses continua a fazer sentido a crença numa entidade superior (...)"
Estamos portanto, de acordo! Além do que a primeira frase minha que eu citei, incorpora em si uma questão, que é a de saber até que ponto a teoria social é válida. Será que temos essa necessidade (os que a têm, claro!) ou ela é-nos incutida e passada de geração em geração ?
Já porém quando dizes que "As divindades variam, alteram-se, mudam de nome consoante as épocas e as culturas. Mas isso é irrelevante, o Deus é sempre o mesmo, independentemente do nome que lhe dão.",
já não estamos; esta discussão dava pano para mangas, mas aqui não é o lugar certo. Todavia penso que concordarás comigo que a percepção que se possa ter do que dizes varia muito de época para época. Na mitologia grega, entre Deuses e o rei dos Deuses e os Titãs, não sei bem em que medida é que haverá nessa época a percepção de um único Deus.
Quando dizes "Não acredito que o Mundo e o Ser Humano tenham surgido por acaso." demonstras que todos (e aqui é mesmo todos, ou quase todos os que têm curiosidade) temos a necessidade de procurar respostas, porque ficar quietos num universo em movimento é essencialmente morrer.
Agora isso é uma coisa, outra é acreditar que exista um motivo, uma razão. E isso são conceitos muito humanos, que nós não sabemos se mais alguém poderia ter inventado. Ninguém sabe se há motivo ou deixa de haver. E não penso, pessoalmente, que haja razão ou motivos para sermos infelizes, se um dia descobrirmos que "acontecemos", no passado e no presente, por acaso.
Todos nós temos um certo "horror ao vácuo", e a tua demonstração de que por vezes sentes Deus, é sinónimo disso. Mas há formas e formas de preencher o vazio. Além disso, tudo o que acontece na vida é sujeito à nossa interpretação, e tu podes interpretar os diversos acontecimentos como bem entenderes, ou melhor dito, como puderes. Para ti, uma sequência de acontecimentos felizes - "com a força das pessoas, quando supostamente já deveriam ter sucumbido, na alegria no meio de grandes dificuldades, nos "Anjos da Guarda" que nos vão aparecendo durante a vida" - que te faz "sentir" e de certa forma acreditar numa entidades dessas, contradiz o que disseste antes sobre o não acreditares que Deus possa interferir na nossa vida:
"(...) Purgatório na "mão" de Deus na vida de cada um, no destino traçado por Ele. A ser assim, teríamos um Pai extremamente injusto e cheio de preferências por alguns dos seus filhos. A ser assim, seria um Deus cruel, desumano e sádico."
É que, como dizia, a sequência feliz de acontecimentos que o é para ti, já para quem está ali ao teu lado ou a quilómetros de distância, pode ser uma tragédia, desencadeada pelos mesmos factores que a ti te fazem feliz. Uma pessoa amiga que é salva de um Tsunami pode ser encarado como uma ajuda de Deus, um ""Anjos da Guarda" que nos vão aparecendo durante a vida", como tu dizes, mas que, a ser verdade, revelaria por parte de Deus, uma estranha forma de intervenção de cortesia, em pequenas quantidades, como quem pode mais, mas não quer, e que, no essencial, ao revelar actuar aqui, mas não ali, deixando muitas pessoas morrer nesse mesmo Tsunami, uma aparente injustiça. E digo "aparente" porque até pode ter bons motivos (se os houver), mas serão muitas vezes insondáveis. E depois nós podemos interpretar como quisermos, como é costume.
Mas, acima de tudo, é a noção de que o que nos acontece é de alguma forma apadrinhado por uma entidade superior, como se as coisas acontecessem, de certa forma a 'pensar' em nós. Há, no meu entender uma certa dose de egoísmo nesta forma de pensar.
Dir-me-às que sou arrogante por falar assim, e estás no teu pleno direito, mas eu penso que, no caminho da busca de algo que nos permita preencher o vazio que quase todos sentiremos, uma boa dose de humildade, de que poderemos inclusive ter de nos conformarmos por, um dia, eventualmente, quando a vida humana acabar, chegarmos a esse fim sem as respostas que procuramos. É que parecendo que não, a ignorância das respostas que eu penso levar à necessidade humana de acreditar que há algo mais que explica tudo isto, também comporta uma dose, ainda que admita que inconsciente, de arrogância, por querer pretender ter chegado à resposta, aparentemente final (para quem assim acredita), sem para isso ter trabalhado assim tanto. Todas as respostas científicas que temos hoje são, por outro lado, fruto de muito trabalho, e são, feliz ou infelizmente, incompletas.
A ignorância é daquelas coisas que é ilimitada, e o conhecimento anda sempre um passo atrás, no seu encalço.
Guida:
Venho do teu texto, pois! Já me apetecia escrever algo sobre esta temática, aliás, até já tinha escrito, mas nunca publicado. É muito difícil escrever sobre este tema, porque há sempre muitas emoções a pairar tanto de quem escreve e de quem lê e é difícil encontrar um registo, uma abordagem que me satisfaça. O teu texto, aliado ao que já queria ter dito há muito tempo sobre o episódio do Felipe Massa, que é apenas mais um de muitos, mas que tem mais projecção mediática, serviu-me de inspiração para escrever esta reflexão.
O Felipe Massa acredita que conhece Deus, de certa forma, ainda que incompleta, porque foi isso que lhe ensinaram; tivesse nascido noutra região do mundo e conheceria o Deus ou Deuses de forma diferente, com "vozes", ditos, ensinamentos e costumes diferentes. Em boa medida é assim. Claro que há excepções, mas é difícil desprender-mo-nos do sistema no qual nos habituámos e nos habituaram a viver. É como te dizerem para desaprenderes a falar português. Mesmo que tu saibas falar outra língua, é algo que não faz sentido para ti. Tu sabes, tu comunicas com os outros nessa língua, formas laços, crias ligações afectivas duradouras, hábitos e ritmos sociais que podes até não questionar e que te fazem falta no preencher do vazio, do vácuo que referi acima, mas também porque como matiz é difícil substituí-la.
Quanto ao destino que tu acreditas que temos marcado, eu não sei. Essencialmente porque, na génese do problema como eu o encaro, não sei sequer se há motivo para existirmos ou se pura e simplesmente existimos. E devolvo-te uma questão quanto ao destino: tu acreditas porque pensas ou pensas porque acreditas ?
Concordo em absoluto quando dizes "E essa vontade de agradecimento é um sentimento de proximidade e de amor aos outros." É é por isso que eu critico o Felipe Massa e todos os outros que deviam agradecer a todos os que por cá andam e andaram e tiveram influência no facto de ele ainda cá estar, de boa saúde, depois do acidente. Fazer uma lista dá trabalho, pois dá, é muito mais fácil fazer um "wrap it all up and thank God" Temos sempre a quem agradecer. É só procurarmos, nem que seja de um modo um pouco mais genérico se tivermos falta de tempo. Agora agradecer a Deus é, no meu entender, sintoma de uma estranha e injustificável falta de tempo.
"Tu não te sentes incompleto?"
- Não. E sim. Mas não é por isso que me sinto ou deixo de sentir feliz. Se me sinto vazio por não saber de onde venho, para onde vou, como existo e se há um porquê de existir ? Não propriamente. Sinto curiosidade, mas também sei que provavelmente nunca vou saber as respostas. Já saber colocar a pergunta é magnífico. Depois do momento aterrador inicial e de momentos aqui e ali em que me recoloco estas perguntas e filosofo, a vida continua e a busca de respostas em outros domínios, porque há tanta coisa para descobrir e para saber, não me deixam tempo para ficar a contemplar o vazio preenchido por algo que eu não consigo demonstrar. É óptimo sabermos colocar a possibilidade em cima da mesa como auxiliar de raciocínio e contraposição, mas acreditar, porque sim, sem qualquer prova ?
Não sei se, como dizes, somos de facto completos embora pensemos o contrário porque ainda não chegámos ao profundo de nós mesmos para sentir a existência e assim apurarmos a mecânica, o fluir e o sentido da nossa existência. Podemos até ser incompletos, como dizia há pouco. Porque esse facto por si só não impede nada, antes pelo contrário, impele-nos para a frente, para procurarmos respostas. Mesmo que nunca as encontremos. E assim ficaremos de facto para sempre incompletos. E até cientes disso, sem que contudo isso afecte seja o que for. Não temos necessidade de ser completos. Temos sim, de procurar cada vez mais respostas.
"Existir é uma real trabalheira e é muito mais fácil atribuir tudo ao Deus conhecido do que procurar respostas... Sempre foi assim, por mais polémica que seja esta ideia!"
Remate quase perfeito. Só lhe acrescento ao Deus conhecido, o teu Deus desconhecido. No fundo, 'é' tudo o mesmo.
Rute, quando dizes "Não sei se concordo contigo quando disses que as pessoas precisam de acreditar em Deus, como se essa necessidade fosse universal! Penso que não, há pessoas que não acreditam, não querem, nem precisam de acreditar.",
atenta que eu disse, e cito: "Talvez um dia também consigamos demonstrar cientificamente a teoria social do porquê muitas pessoas sentirem a necessidade de acreditar em Deus (...)" e no parágrafo seguinte: "(...) mesmo para alguns desses continua a fazer sentido a crença numa entidade superior (...)"
Estamos portanto, de acordo! Além do que a primeira frase minha que eu citei, incorpora em si uma questão, que é a de saber até que ponto a teoria social é válida. Será que temos essa necessidade (os que a têm, claro!) ou ela é-nos incutida e passada de geração em geração ?
Já porém quando dizes que "As divindades variam, alteram-se, mudam de nome consoante as épocas e as culturas. Mas isso é irrelevante, o Deus é sempre o mesmo, independentemente do nome que lhe dão.",
já não estamos; esta discussão dava pano para mangas, mas aqui não é o lugar certo. Todavia penso que concordarás comigo que a percepção que se possa ter do que dizes varia muito de época para época. Na mitologia grega, entre Deuses e o rei dos Deuses e os Titãs, não sei bem em que medida é que haverá nessa época a percepção de um único Deus.
Quando dizes "Não acredito que o Mundo e o Ser Humano tenham surgido por acaso." demonstras que todos (e aqui é mesmo todos, ou quase todos os que têm curiosidade) temos a necessidade de procurar respostas, porque ficar quietos num universo em movimento é essencialmente morrer.
Agora isso é uma coisa, outra é acreditar que exista um motivo, uma razão. E isso são conceitos muito humanos, que nós não sabemos se mais alguém poderia ter inventado. Ninguém sabe se há motivo ou deixa de haver. E não penso, pessoalmente, que haja razão ou motivos para sermos infelizes, se um dia descobrirmos que "acontecemos", no passado e no presente, por acaso.
Todos nós temos um certo "horror ao vácuo", e a tua demonstração de que por vezes sentes Deus, é sinónimo disso. Mas há formas e formas de preencher o vazio. Além disso, tudo o que acontece na vida é sujeito à nossa interpretação, e tu podes interpretar os diversos acontecimentos como bem entenderes, ou melhor dito, como puderes. Para ti, uma sequência de acontecimentos felizes - "com a força das pessoas, quando supostamente já deveriam ter sucumbido, na alegria no meio de grandes dificuldades, nos "Anjos da Guarda" que nos vão aparecendo durante a vida" - que te faz "sentir" e de certa forma acreditar numa entidades dessas, contradiz o que disseste antes sobre o não acreditares que Deus possa interferir na nossa vida:
"(...) Purgatório na "mão" de Deus na vida de cada um, no destino traçado por Ele. A ser assim, teríamos um Pai extremamente injusto e cheio de preferências por alguns dos seus filhos. A ser assim, seria um Deus cruel, desumano e sádico."
É que, como dizia, a sequência feliz de acontecimentos que o é para ti, já para quem está ali ao teu lado ou a quilómetros de distância, pode ser uma tragédia, desencadeada pelos mesmos factores que a ti te fazem feliz. Uma pessoa amiga que é salva de um Tsunami pode ser encarado como uma ajuda de Deus, um ""Anjos da Guarda" que nos vão aparecendo durante a vida", como tu dizes, mas que, a ser verdade, revelaria por parte de Deus, uma estranha forma de intervenção de cortesia, em pequenas quantidades, como quem pode mais, mas não quer, e que, no essencial, ao revelar actuar aqui, mas não ali, deixando muitas pessoas morrer nesse mesmo Tsunami, uma aparente injustiça. E digo "aparente" porque até pode ter bons motivos (se os houver), mas serão muitas vezes insondáveis. E depois nós podemos interpretar como quisermos, como é costume.
Mas, acima de tudo, é a noção de que o que nos acontece é de alguma forma apadrinhado por uma entidade superior, como se as coisas acontecessem, de certa forma a 'pensar' em nós. Há, no meu entender uma certa dose de egoísmo nesta forma de pensar.
Dir-me-às que sou arrogante por falar assim, e estás no teu pleno direito, mas eu penso que, no caminho da busca de algo que nos permita preencher o vazio que quase todos sentiremos, uma boa dose de humildade, de que poderemos inclusive ter de nos conformarmos por, um dia, eventualmente, quando a vida humana acabar, chegarmos a esse fim sem as respostas que procuramos. É que parecendo que não, a ignorância das respostas que eu penso levar à necessidade humana de acreditar que há algo mais que explica tudo isto, também comporta uma dose, ainda que admita que inconsciente, de arrogância, por querer pretender ter chegado à resposta, aparentemente final (para quem assim acredita), sem para isso ter trabalhado assim tanto. Todas as respostas científicas que temos hoje são, por outro lado, fruto de muito trabalho, e são, feliz ou infelizmente, incompletas.
A ignorância é daquelas coisas que é ilimitada, e o conhecimento anda sempre um passo atrás, no seu encalço.
Guida:
Venho do teu texto, pois! Já me apetecia escrever algo sobre esta temática, aliás, até já tinha escrito, mas nunca publicado. É muito difícil escrever sobre este tema, porque há sempre muitas emoções a pairar tanto de quem escreve e de quem lê e é difícil encontrar um registo, uma abordagem que me satisfaça. O teu texto, aliado ao que já queria ter dito há muito tempo sobre o episódio do Felipe Massa, que é apenas mais um de muitos, mas que tem mais projecção mediática, serviu-me de inspiração para escrever esta reflexão.
O Felipe Massa acredita que conhece Deus, de certa forma, ainda que incompleta, porque foi isso que lhe ensinaram; tivesse nascido noutra região do mundo e conheceria o Deus ou Deuses de forma diferente, com "vozes", ditos, ensinamentos e costumes diferentes. Em boa medida é assim. Claro que há excepções, mas é difícil desprender-mo-nos do sistema no qual nos habituámos e nos habituaram a viver. É como te dizerem para desaprenderes a falar português. Mesmo que tu saibas falar outra língua, é algo que não faz sentido para ti. Tu sabes, tu comunicas com os outros nessa língua, formas laços, crias ligações afectivas duradouras, hábitos e ritmos sociais que podes até não questionar e que te fazem falta no preencher do vazio, do vácuo que referi acima, mas também porque como matiz é difícil substituí-la.
Quanto ao destino que tu acreditas que temos marcado, eu não sei. Essencialmente porque, na génese do problema como eu o encaro, não sei sequer se há motivo para existirmos ou se pura e simplesmente existimos. E devolvo-te uma questão quanto ao destino: tu acreditas porque pensas ou pensas porque acreditas ?
Concordo em absoluto quando dizes "E essa vontade de agradecimento é um sentimento de proximidade e de amor aos outros." É é por isso que eu critico o Felipe Massa e todos os outros que deviam agradecer a todos os que por cá andam e andaram e tiveram influência no facto de ele ainda cá estar, de boa saúde, depois do acidente. Fazer uma lista dá trabalho, pois dá, é muito mais fácil fazer um "wrap it all up and thank God" Temos sempre a quem agradecer. É só procurarmos, nem que seja de um modo um pouco mais genérico se tivermos falta de tempo. Agora agradecer a Deus é, no meu entender, sintoma de uma estranha e injustificável falta de tempo.
"Tu não te sentes incompleto?"
- Não. E sim. Mas não é por isso que me sinto ou deixo de sentir feliz. Se me sinto vazio por não saber de onde venho, para onde vou, como existo e se há um porquê de existir ? Não propriamente. Sinto curiosidade, mas também sei que provavelmente nunca vou saber as respostas. Já saber colocar a pergunta é magnífico. Depois do momento aterrador inicial e de momentos aqui e ali em que me recoloco estas perguntas e filosofo, a vida continua e a busca de respostas em outros domínios, porque há tanta coisa para descobrir e para saber, não me deixam tempo para ficar a contemplar o vazio preenchido por algo que eu não consigo demonstrar. É óptimo sabermos colocar a possibilidade em cima da mesa como auxiliar de raciocínio e contraposição, mas acreditar, porque sim, sem qualquer prova ?
Não sei se, como dizes, somos de facto completos embora pensemos o contrário porque ainda não chegámos ao profundo de nós mesmos para sentir a existência e assim apurarmos a mecânica, o fluir e o sentido da nossa existência. Podemos até ser incompletos, como dizia há pouco. Porque esse facto por si só não impede nada, antes pelo contrário, impele-nos para a frente, para procurarmos respostas. Mesmo que nunca as encontremos. E assim ficaremos de facto para sempre incompletos. E até cientes disso, sem que contudo isso afecte seja o que for. Não temos necessidade de ser completos. Temos sim, de procurar cada vez mais respostas.
"Existir é uma real trabalheira e é muito mais fácil atribuir tudo ao Deus conhecido do que procurar respostas... Sempre foi assim, por mais polémica que seja esta ideia!"
Remate quase perfeito. Só lhe acrescento ao Deus conhecido, o teu Deus desconhecido. No fundo, 'é' tudo o mesmo.
12 de junho de 2010
"A Um Deus Desconhecido" ?
A todos:
(Se não lerem mais nenhum post deste blogue, leiam pelo menos este)
Quando o Felipe Massa, piloto de Fórmula 1, teve aquele infortúnio grave que quase o matava, eu evidentemente solidarizei-me com os familiares e com todos os adeptos e demais pessoas que o conheciam e lhe queriam bem, nos desejos de melhoras rápidas e completas, e de que ele pudesse regressar em breve à competição.
Foi um acidente lamentável, mas acontece. A técnica é apurada, mas pode haver sempre um descuido humano ou uma falha no material de que resultam às vezes coisas insignificantes, ou, como foi o caso, muito graves.
Mas a Fórmula 1, como desporto-rei das quatro rodas, tem sido o expoente máximo das inovações científicas e tecnológicas: se não fosse o capacete que muitas pessoas ajudaram a desenvolver ao longo dos anos, incluindo o ex-colega de equipa Michael Schumacher, o Felipe Massa hoje poderia não estar connosco.
Se muitos antes dele, ao longo das décadas, não tivessem infelizmente ficado pelo caminho - porque isto dos avanços, seja em que área for, tem quase sempre vítimas e mártires - hoje o Felipe Massa poderia estar justamente a ser ele próprio uma vítima e um mártir, para sempre lembrado na história como um dos que ajudou a tornar o desporto mais seguro.
Se não fossem todos os que conduziram carros sem as protecções que os de hoje têm e se eles não se tivessem espetado na curva seguinte e infelizmente provado que o carro precisava de mais segurança; se as curvas não tivessem sido desenhadas e alteradas ao longo dos anos para que se tornassem cada vez mais seguras, recorrendo à experiência, a cálculos matemáticos de velocidade e resistência dos materiais; se não se tivessem lembrado de colocar pneus nas barreiras para amortecer o choque (e se os pneus não tivessem sido inventados e aperfeiçoados!), de que o Felipe beneficiou; se não se tivesse inventado um meio de transporte rápido, que pode aterrar e descolar na vertical - helicóptero, que permite o socorro e a deslocação em tempo útil dos feridos até ao hospital; se os médicos de hoje não fossem o resultado do saber acumulado de estudiosos e médicos anteriores - que também cometeram erros (há sempre mártires, como dizia) - até se chegar ao estado da técnica que hoje há; se não houvesse nada disto, mesmo com toda a boa vontade do mundo, o Felipe Massa poderia muito bem não estar aqui para agradecer.
E foi justamente agradecer a primeira coisa que Felipe Massa fez quando voltou à ribalta. Agradecer a Deus.
Deus que não fez nada para impedir que uma mola saltasse da traseira do carro do seu compatriota Rubens Barichello e o atingisse a alta velocidade, aumentando exponencialmente o seu relativamente diminuto peso de 800 gramas. Só depois é que Massa agradeceu aos médicos. Os médicos que só o puderam salvar porque todos os outros factores que eu referi acima estavam presentes, porque o capacete ainda o protegeu, porque o carro é mais seguro do que há uns anos, porque as barreiras de protecção existiam e absorveram o impacto do carro, porque havia um helicóptero. Porque muitos trabalharam e outros ficaram pelo caminho. Tudo fruto de trabalho árduo de pessoas de carne e osso, ao longo das décadas, para que pudéssemos chegar ao ponto de desenvolvimento e conhecimento que temos hoje, e de que ele, Felipe Massa, pudesse, entre outros, beneficiar.
Deus que, se é omnipresente como dizem, presenciou o acidente e nada fez para que aquilo não acontecesse. Ou, numa hipótese que muitos não considerarão possível, ainda que seja concebível, Deus quis que acontecesse daquela forma.
Seja como for, ao não impedir, compactuou. É como estarmos numa peça de teatro em que somos todos marionetas ao dispor do senhor que puxa os cordelinhos. Podemos ter a liberdade de pensar, mas os nossos movimentos e o nosso destino ficam ao sabor alheio. Que significado tem uma pessoa agradecer a um Deus que não se sabe que papel teve no seu acidente, e cujo papel, por igual razão, também não se sabe ter tido na sua recuperação, excluindo o de, pelo menos, não ter conspirado contra?
Será um agradecimento submisso, de alguém que se submeteu a Deus e se declara à sua mercê, como diz o islamismo ? Alguém que não critica ou pede explicações quando acontece o infortúnio, mas que agradece quando acontecem coisas boas ?
É uma pessoa ser colocada no mundo com certas características e depois aprender, à custa de sofrimento, a melhorá-las e agradecer a Deus essa possibilidade - quando têm essa possibilidade e não morrem no processo, num qualquer acidente estúpido ?
Enquanto isso, outras pessoas são incomparavelmente mais sortudas, felizes e vivem uma vida muito mais preenchida e longa. É por isso que se acredita na reencarnação ? Porque, mais cedo ou mais tarde, também nos vai calhar na rifa cósmica nascer no sítio certo, à hora certa, nas condições e ambiente social e genético certos, como pessoas, outros animais, plantas ou árvores ?
Ninguém sabe a resposta. Muita gente acredita que sabe a resposta, mas ninguém consegue demonstrar que está certo. Ninguém sabe o que o futuro reserva. Ninguém sabe explicar o funcionamento "disto".
"Isto" é sem dúvida muito interessante, sem dúvida. Reconfortante, recompensador quando nos esforçamos e a coisa corre bem; que nos torna humildes quando não corre bem e temos mais chances e conseguimos com determinação, sabedoria e humildade, vencer. Do superlativo positivo ao superlativo negativo existe de tudo, em quantidades e em espaços variáveis.
Ninguém sabe porque é que existimos, e como é que existimos. Ninguém sabe o que é o contrário de "haver".
Pode ser que um dia lá cheguemos. Cada dia sabemos mais. De coisas que conseguimos, de facto, demonstrar.
Talvez um dia também consigamos demonstrar científicamente a teoria social do porquê muitas pessoas sentirem a necessidade de acreditar em Deus, mesmo aquelas pessoas que sabem que antes de Jesus Cristo, o seu Pai e o Espírito Santo, houve muitos outros Deuses, inclusive estátuas da Deusa egípcia Ísis com o menino Órus ao colo, que foram depois utilizadas, tal qual, como mostrando a Nossa Senhora com o Menino Jesus ao colo.
Mesmo para esses, que não ignoram a história e o conhecimento acumulado da humanidade, que sabem que todos os Deuses são relativos, porque conhecem os que são venerados agora e os que foram venerados antes, mesmo para alguns desses continua a fazer sentido a crença numa entidade superior, desligada das religiões - tão terrenas, efémeras e mutáveis, por muito impossível que lhes seja descrever o como e o porquê.
Ora aí está uma pergunta interessante: porque é algumas pessoas têm a necessidade de acreditar ? É genético ? É social ?
A mim porém nunca me convenceu a explicação que nunca foi explicada. Não é só pelo facto de nunca ter sido explicada, demonstrada, e isso dava pano para mangas, mas pelo facto de essa explicação, por muito gloriosa que possa ser, não responder às duas perguntas fundamentais: como, porquê?
Como é que há Deus, porque é que há Deus ?
Como é que existimos, porque é que existimos ?
A simples possibilidade que nós, seres humanos temos de fazer estas perguntas, é simultaneamente fabulosa, maravilhosa e um autêntico orgasmo da existência, mas ao mesmo tempo é aterradora. O facto de, ao contrário das crianças muito novas, termos plena consciência do aqui e do agora e não sabermos responder às questões que entretanto tivemos o brilhantismo de conseguir colocar. É talvez pelo terror que isso provoca que há pessoas que decidem, deixam-se, submeter-se a um Deus desconhecido, que julgam, através de múltiplas histórias que enformam uma civilização, conhecer. Sempre é melhor ter uma explicação que nos sirva de abóbada do que o vazio.
Há mesmo quem decida que Deus não é terceiro, mas que somos todos, tudo o que existe e conhecemos e o que existe e ainda não conhecemos. Mas, ainda assim, as duas perguntas acima colocadas ficam por responder e nenhuma das questões acerca do funcionamento do "matrix" fica esclarecida.
Eu prefiro o vazio. Pode parecer estranho. Mas também é verdade que o vazio já foi mais vazio, e há-de ser cada vez menos vazio. Se um dia iremos conseguir responder às duas perguntas que coloquei acima ? Acho que não. Tenho quase a certeza que não, que nunca vamos descobrir. Nesse dia tudo acabaria. Teríamos chegado, por assim dizer, ao fim do jogo, do puzzle. E no meu modesto entender, este puzzle é infinito.
E com o que temos sempre nos governámos, venha Deus daqui ou dali, apareça e desapareça esta ou aquela religião, esta ou aquela crença, nós existimos ao longo dessa história. Porque nos temos uns aos outros. E eu acredito nas mulheres e nos homens. Mesmo quando não acredito no que eles dizem, é o que temos. É nossa tarefa fazermos com o que temos o melhor que pudermos. Se quisermos ser felizes, claro. É cá uma intuição que eu tenho :D
(Se não lerem mais nenhum post deste blogue, leiam pelo menos este)
Quando o Felipe Massa, piloto de Fórmula 1, teve aquele infortúnio grave que quase o matava, eu evidentemente solidarizei-me com os familiares e com todos os adeptos e demais pessoas que o conheciam e lhe queriam bem, nos desejos de melhoras rápidas e completas, e de que ele pudesse regressar em breve à competição.
Foi um acidente lamentável, mas acontece. A técnica é apurada, mas pode haver sempre um descuido humano ou uma falha no material de que resultam às vezes coisas insignificantes, ou, como foi o caso, muito graves.
Mas a Fórmula 1, como desporto-rei das quatro rodas, tem sido o expoente máximo das inovações científicas e tecnológicas: se não fosse o capacete que muitas pessoas ajudaram a desenvolver ao longo dos anos, incluindo o ex-colega de equipa Michael Schumacher, o Felipe Massa hoje poderia não estar connosco.
Se muitos antes dele, ao longo das décadas, não tivessem infelizmente ficado pelo caminho - porque isto dos avanços, seja em que área for, tem quase sempre vítimas e mártires - hoje o Felipe Massa poderia estar justamente a ser ele próprio uma vítima e um mártir, para sempre lembrado na história como um dos que ajudou a tornar o desporto mais seguro.
Se não fossem todos os que conduziram carros sem as protecções que os de hoje têm e se eles não se tivessem espetado na curva seguinte e infelizmente provado que o carro precisava de mais segurança; se as curvas não tivessem sido desenhadas e alteradas ao longo dos anos para que se tornassem cada vez mais seguras, recorrendo à experiência, a cálculos matemáticos de velocidade e resistência dos materiais; se não se tivessem lembrado de colocar pneus nas barreiras para amortecer o choque (e se os pneus não tivessem sido inventados e aperfeiçoados!), de que o Felipe beneficiou; se não se tivesse inventado um meio de transporte rápido, que pode aterrar e descolar na vertical - helicóptero, que permite o socorro e a deslocação em tempo útil dos feridos até ao hospital; se os médicos de hoje não fossem o resultado do saber acumulado de estudiosos e médicos anteriores - que também cometeram erros (há sempre mártires, como dizia) - até se chegar ao estado da técnica que hoje há; se não houvesse nada disto, mesmo com toda a boa vontade do mundo, o Felipe Massa poderia muito bem não estar aqui para agradecer.
E foi justamente agradecer a primeira coisa que Felipe Massa fez quando voltou à ribalta. Agradecer a Deus.
Deus que não fez nada para impedir que uma mola saltasse da traseira do carro do seu compatriota Rubens Barichello e o atingisse a alta velocidade, aumentando exponencialmente o seu relativamente diminuto peso de 800 gramas. Só depois é que Massa agradeceu aos médicos. Os médicos que só o puderam salvar porque todos os outros factores que eu referi acima estavam presentes, porque o capacete ainda o protegeu, porque o carro é mais seguro do que há uns anos, porque as barreiras de protecção existiam e absorveram o impacto do carro, porque havia um helicóptero. Porque muitos trabalharam e outros ficaram pelo caminho. Tudo fruto de trabalho árduo de pessoas de carne e osso, ao longo das décadas, para que pudéssemos chegar ao ponto de desenvolvimento e conhecimento que temos hoje, e de que ele, Felipe Massa, pudesse, entre outros, beneficiar.
Deus que, se é omnipresente como dizem, presenciou o acidente e nada fez para que aquilo não acontecesse. Ou, numa hipótese que muitos não considerarão possível, ainda que seja concebível, Deus quis que acontecesse daquela forma.
Seja como for, ao não impedir, compactuou. É como estarmos numa peça de teatro em que somos todos marionetas ao dispor do senhor que puxa os cordelinhos. Podemos ter a liberdade de pensar, mas os nossos movimentos e o nosso destino ficam ao sabor alheio. Que significado tem uma pessoa agradecer a um Deus que não se sabe que papel teve no seu acidente, e cujo papel, por igual razão, também não se sabe ter tido na sua recuperação, excluindo o de, pelo menos, não ter conspirado contra?
Será um agradecimento submisso, de alguém que se submeteu a Deus e se declara à sua mercê, como diz o islamismo ? Alguém que não critica ou pede explicações quando acontece o infortúnio, mas que agradece quando acontecem coisas boas ?
É uma pessoa ser colocada no mundo com certas características e depois aprender, à custa de sofrimento, a melhorá-las e agradecer a Deus essa possibilidade - quando têm essa possibilidade e não morrem no processo, num qualquer acidente estúpido ?
Enquanto isso, outras pessoas são incomparavelmente mais sortudas, felizes e vivem uma vida muito mais preenchida e longa. É por isso que se acredita na reencarnação ? Porque, mais cedo ou mais tarde, também nos vai calhar na rifa cósmica nascer no sítio certo, à hora certa, nas condições e ambiente social e genético certos, como pessoas, outros animais, plantas ou árvores ?
Ninguém sabe a resposta. Muita gente acredita que sabe a resposta, mas ninguém consegue demonstrar que está certo. Ninguém sabe o que o futuro reserva. Ninguém sabe explicar o funcionamento "disto".
"Isto" é sem dúvida muito interessante, sem dúvida. Reconfortante, recompensador quando nos esforçamos e a coisa corre bem; que nos torna humildes quando não corre bem e temos mais chances e conseguimos com determinação, sabedoria e humildade, vencer. Do superlativo positivo ao superlativo negativo existe de tudo, em quantidades e em espaços variáveis.
Ninguém sabe porque é que existimos, e como é que existimos. Ninguém sabe o que é o contrário de "haver".
Pode ser que um dia lá cheguemos. Cada dia sabemos mais. De coisas que conseguimos, de facto, demonstrar.
Talvez um dia também consigamos demonstrar científicamente a teoria social do porquê muitas pessoas sentirem a necessidade de acreditar em Deus, mesmo aquelas pessoas que sabem que antes de Jesus Cristo, o seu Pai e o Espírito Santo, houve muitos outros Deuses, inclusive estátuas da Deusa egípcia Ísis com o menino Órus ao colo, que foram depois utilizadas, tal qual, como mostrando a Nossa Senhora com o Menino Jesus ao colo.
Mesmo para esses, que não ignoram a história e o conhecimento acumulado da humanidade, que sabem que todos os Deuses são relativos, porque conhecem os que são venerados agora e os que foram venerados antes, mesmo para alguns desses continua a fazer sentido a crença numa entidade superior, desligada das religiões - tão terrenas, efémeras e mutáveis, por muito impossível que lhes seja descrever o como e o porquê.
Ora aí está uma pergunta interessante: porque é algumas pessoas têm a necessidade de acreditar ? É genético ? É social ?
A mim porém nunca me convenceu a explicação que nunca foi explicada. Não é só pelo facto de nunca ter sido explicada, demonstrada, e isso dava pano para mangas, mas pelo facto de essa explicação, por muito gloriosa que possa ser, não responder às duas perguntas fundamentais: como, porquê?
Como é que há Deus, porque é que há Deus ?
Como é que existimos, porque é que existimos ?
A simples possibilidade que nós, seres humanos temos de fazer estas perguntas, é simultaneamente fabulosa, maravilhosa e um autêntico orgasmo da existência, mas ao mesmo tempo é aterradora. O facto de, ao contrário das crianças muito novas, termos plena consciência do aqui e do agora e não sabermos responder às questões que entretanto tivemos o brilhantismo de conseguir colocar. É talvez pelo terror que isso provoca que há pessoas que decidem, deixam-se, submeter-se a um Deus desconhecido, que julgam, através de múltiplas histórias que enformam uma civilização, conhecer. Sempre é melhor ter uma explicação que nos sirva de abóbada do que o vazio.
Há mesmo quem decida que Deus não é terceiro, mas que somos todos, tudo o que existe e conhecemos e o que existe e ainda não conhecemos. Mas, ainda assim, as duas perguntas acima colocadas ficam por responder e nenhuma das questões acerca do funcionamento do "matrix" fica esclarecida.
Eu prefiro o vazio. Pode parecer estranho. Mas também é verdade que o vazio já foi mais vazio, e há-de ser cada vez menos vazio. Se um dia iremos conseguir responder às duas perguntas que coloquei acima ? Acho que não. Tenho quase a certeza que não, que nunca vamos descobrir. Nesse dia tudo acabaria. Teríamos chegado, por assim dizer, ao fim do jogo, do puzzle. E no meu modesto entender, este puzzle é infinito.
E com o que temos sempre nos governámos, venha Deus daqui ou dali, apareça e desapareça esta ou aquela religião, esta ou aquela crença, nós existimos ao longo dessa história. Porque nos temos uns aos outros. E eu acredito nas mulheres e nos homens. Mesmo quando não acredito no que eles dizem, é o que temos. É nossa tarefa fazermos com o que temos o melhor que pudermos. Se quisermos ser felizes, claro. É cá uma intuição que eu tenho :D
10 de junho de 2010
Este dia serve para uma coisa
O dia 1 de Janeiro é feriado. Se por um lado serve o propósito de dar às pessoas tempo suficiente para se recomporem da festança do dia anterior, não deixa de ser irónico que o primeiro dia de cada ano seja de não se fazer nada; para os mais cínicos é o mote para o resto do ano.
Para outros é dia de trabalho, porque nem todos podem parar, mas acima de tudo deve servir para, pelo menos neste dia, se fazer uma reflexão do que se quer para os próximos 364 dias, ou para o resto da nossa existência, até que melhores razões se levantem para reflectirmos outra vez, o que pode ser todos os dias, todas as semanas, todos os meses, de todos os anos.
P.S.: Andei a fazer uma limpeza geral no blogue, e, além de ter retirado todos os posts que faziam alusão aos artigos dos meus outros blogues, também descobri este post, tal como está, por publicar, justamente com data de 1 de Janeiro. Da última frase podem retirar o motivo pelo qual decidi publicá-lo hoje. Substituam o dia 1 de Janeiro pelo dia de hoje, ou por outro qualquer. Não há dias marcados para pensar nos nossos projectos.
Para outros é dia de trabalho, porque nem todos podem parar, mas acima de tudo deve servir para, pelo menos neste dia, se fazer uma reflexão do que se quer para os próximos 364 dias, ou para o resto da nossa existência, até que melhores razões se levantem para reflectirmos outra vez, o que pode ser todos os dias, todas as semanas, todos os meses, de todos os anos.
P.S.: Andei a fazer uma limpeza geral no blogue, e, além de ter retirado todos os posts que faziam alusão aos artigos dos meus outros blogues, também descobri este post, tal como está, por publicar, justamente com data de 1 de Janeiro. Da última frase podem retirar o motivo pelo qual decidi publicá-lo hoje. Substituam o dia 1 de Janeiro pelo dia de hoje, ou por outro qualquer. Não há dias marcados para pensar nos nossos projectos.
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